terça-feira, 24 de abril de 2012

Quando eu envelheço

Talvez um dia eu fique velho                      
E na velhice essa que eu serei                       
Sentirei enfim existir                                         
No compasso lento do fim de tudo         

Falhar-me-á então a memoria                         

Como falha agora                               
E não lembrarei mais do corpo                        
Da menina de outrora              
Feita mulher em meus braços              
Tão minha foste toda                         
Tão toda morta está neste agora                
                                                
Doravante morrerei aos poucos                     

E escreverei aos montes                         
Talvez os temas que antes estes me encantem        
Assim como este agora encanta                                        
Ver-me-ão com o peso da nostalgia                  
Rebentando-se em um só nó na minha garganta         
Talvez na velhice não sinta medo da morte                
Nem da vida                                                                      
Tão pouco medo de não viver a vida
Sentirei portanto, talvez
De ler tudo que escrevi
De ver tudo que pintei
De saber tudo que saberei

Errar-me-ei na vida trombaleando os passos
Perdido no espaço, vazado no tempo
Que nunca parei sem fotografar
Em meio a neblina do meu passado
E a fumaça toxica da velhice
Verei o navio da minha vida zarpar


E mesmo sem alguém que questione 
Minha alma responderá 
Diante da luz na porta 
Do fim do fundo do corredor da existência
                                                                          
Não quero que por mim passe 
P’ra que rasgue o fim da estrada
Toda minha vida frente aos meus olhos
querei eu então do âmago do meu ser
No centro do meu mundo 
Ver a minha vida rebobinar-se e o tempo regressar
Verei eu proprio despintar meus quadros  
Desescrever meus textos
E tudo mais se desfazer ao meu redor

Todo um dia será um segundo 
Num retrocesso de embrulhar o estômago 
E saberei o tom das coisas vistas 
Começadas pelo fim 
Da velhice voltar-me-ei à infancia
 E verei a mim no fim da vida
 Acalentando-me novamente 
No útero de minha mãe.

                                                 Vinícius Faria



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