Um ritual para mentes mais apuradas. Para homens da linha superior. Àqueles que viviam acima da moralidade. Um ritual que confundia o mundo astral usando artimanhas do seguimento normal da natureza para, no limite desta sequência quimérica, encontrar em queda o cadavérico braço do mundo além do mundo.
Somavam-se em onze. Animais minúsculos e desaflorados mas já mergulhados em corpos em uma volúpia ininteligível e pudica. Todos estes estavam em uma pequena sala – se bem que, para eles, a grandeza não tinham significado ao passo que tudo era grande, amplo e magnífico – com paredes de um azul decadente, escuro e penetrante aos pensamentos inocentes dos pequenos. O chão estava decorado com círculos concêntricos de pirulitos. Caídos por todos os cantos como gotas de chuva discretas, estavam balas com simulacros de sabores metafóricos. As próprias paredes encerravam quadros melados e coloridos de forma a representar canções alegres. E, em meio a isto tudo, eles batiam palmas como em uma hipinose dançante, como se tivessem trilhas sonoras por suas mãos e ações.
Pedrinho estava por Fernanda que usava a língua adocicada com Estela que, por sua vez, umidecia as mãos no corpo de Fernando. Mas o próprio Pedrinho estava quase fora do entrelaçado de corpos infantes. Todas as crianças cuspiam-se e deslizavam as mãos delirantes por tudo que tocavam. Os garotos instintivamente procuravam as genitálias masculinas, e acariciavam com vigor e delicadeza cada uma delas, assim como o faziam com os seios minguados das garotinhas que não tinham mais que meia dúzia de verões. Eles pareciam conceber que o apreço pelos seios era a substituição morálica da fruição do toque ao falo de outrém.
As meninas tinham um constante manuseio das mãos. Um misto de impaciência e desespero em meio ao prazer. Tocavam-se onde ainda não havia crescido um pelo sequer. Misturavam com pirulitos lambidos os sabores vaginais e a exsudação. Garotas fascinavam-se no toque das peles, na pressão sobre elas e acariciavam descarnadas bocas desconhecidas. Retorciam-se besuntados com movimentos rítmicos de penetrações intensas, estando todos em um deslumbro do alívio imediato das portas lá fora.
Escarlates baldes de plástico com bordas amarelas continham açucarados refrigerantes modernos onde as crianças banhavam-se para a contínua perda dos suaves e fantasiados passados. Prosseguiam na euforia enquanto entoavam cânticos infantis, assim, riam, corriam e voltavam para a massa humana. Desnudos e naturais, já não bem sabiam contar há quanto estavam ali. Três dias, talvez. Se bem que mal sabiam era contar.
Foi em um destes ensaios de consciência que Paulinho juntou uma calça qualquer – Se era dele? Pouco bem ele sabia o que era ele – e abriu uma das portas. Vislumbrado, pálido, ressequido e usado. Todos mecânicos olhos secos de expressões pararam e fitaram com assombro. Não havia luz do lado de fora das portas. Paulinho todavia caminhou. E rumou pela rua em uma plena escuridão por sobre postes fracos e casas de fachada. Os estáticos olhos devaneavam na ausência de pensamentos e de humanidade. Destarte, deixou a calça na altura dos joelhos e vagou. Ele via as luzes das casas, ouvia as vozes contínuas absortas em seus mundos inalteráveis construídos na manipulação, porém, ele em si, não imaginava, tampouco pensava. Caminhava pelas ruas pouco iluminadas com as calças no joelho e, cativado pelo vazio, apenas seguiu.
Cesar Domity
Nenhum comentário:
Postar um comentário