terça-feira, 28 de agosto de 2012

Janela Amarela

É aqui
Deitado no meu quarto
Que vejo a janela
E mesmo que para mim não seja
É por ela que entra uma luz amarela

Ainda deitado na minha cama me vejo sentado
Pintando um quadro que está ali
Estando menos do que o eu concentrado
Que não há pintando o quadro

A luz amarela me parece como parece tudo
Como se hoje essa fosse a face do mundo
Como ser certo esperar do humano um sorriso
Luz vaga tanto quanto todos os risos

Estou fora de tudo e como todo mundo imagino
Todos deitados em seus quartos
São menos reais que o eu que não sentado pintando o quadro
Quando vejo os outros pensando, sinto-me quebrando um muito imaginar

Todas as paredes da cidade são espelhos
Vejo nelas também todos os que vejo
E tambem vejo todos os que vejo em outro tempo
Tantos de tantos vejo
Tanto de tantos imagino
Que chego a não ver ninguém e me ver partido

O banco da praça sempre será banco
E mesmo que eu mude, nunca serei banco
E o banco que é só banco
Não teria encanto - ou teria se não parecesse banco
Mas seria triste eu não saber que o banco é banco
Vejo em todos tantas coisas que não os vejo
Mesmo o banco é mais real
Eu, agora, não o vendo
Nele sempre vejo banco
Espero sempre ver banco

Meu pensamento é um recanto
Um éden que protege
Tantos édens há em quartos nessa hora
Que se protegem sendo
O que eu vejo não vendo

Para rua, todos levam um mundo criado em seu quarto
Tantos mundos incompatíveis
Os quartos não são iguais
E todas as realidades destrutíveis
Menos as dos quartos que nem ao menos são reais

Hoje me cato na rua solitário
Ninguém mais sai do quarto
Toco em todos com uma seda por cima
Todos sempre onde não estão
Vejo todo mundo em meio a neblina
Com os olhos brilhando onde não são
Mostrando-me sua pele podre e vazia

A noite já não há
E até divertir-se já é uma rotina
Criada, ainda por cima
Pré-fabricada na cama inventada
Para um discançar seguro de tudo
Viver sempre dormindo.

Todas as pesoas não pessoas
Todas as pessoas idéas
Todas as coisas pensadas sem porta de saída
Tanta vida de verdade na mentira
Na rua todas as pessoas fantasiadas
E todas suas fantasias nuas

Agora penso nas pessoas como vi elas
Ou como pensei ver elas
Ou como eu quis ver elas
Ou como eu imaginei ver elas
Aqui no meu quarto de luz e janela amarela

Agora imagino imaginar as pessoas
E elas podem imaginar tanta coisa
E mesmo que pensem em mim
Podem pensar tanta coisa que não sou
E não pensar assim
Como não sei se pensei em ti
Como tu pensaste que te pensei

Todo mundo tão solitário dentro de si
Todo mundo tão protegido dentro de si
Todo mundo existindo sem existir
Todos em seu quarto de luz amarela
Todos vendo o mundo por uma janela
Do quarto sempre inventado

                                 Vinicius Faria








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