domingo, 23 de fevereiro de 2014

As Sensações dos Transeuntes

Um mulato de qualquer nome passeava pelo parque no princípio do entardecer. Amaciava-se no caminhar enquanto absorvia sua essência de animal mesclado; pardo até na alma. Revigora-se entre os desafios dos propostos paradigmas sociais. Porém, falava pouco.
As senhoras que ali passavam e alimentavam as pombas eram, em aspecto bem restrito, mais interessantes que os individuos que com ele se propunham a conversar. Enquanto as senhoras com as roupas em cruzamento do século atual e do século passado alimentavam as gordas pombas com um ar de ambietização da existência, os indivíduos falantes só queriam comunicar seus cotidianos frustrados.
         O caminho do parque possuía uma abóboda de galhos e folhas verdes que traziam a imagem do quente e fortemente colorido verão. Apesar desta estação não ter muitas variações, as cores do verão são normalmente intensas. Assim se baseava para saber em qual estação encontrava-se. Parecia um sistema lógico. O verão e o inverno são oligocromáticos, porém, intensos nestas cores. O primeiro apresenta cores mais vivas enquanto o segundo destaca as frias. A primavera e o outono traziam uma relação diferente tal que a primeira estação era uma miscelânia de nascentes cores em todos os cantos; o outono descascava as mesmas e as punha em sépia e preto. O mulato ainda concluía uma analogia entre o pensamento e as estação: A primavera propunha insights e a reverberação da criatividade ao passo que o outono afundava os homens na reflexão.
         O mulato havia sido doutrinado em uma sociedade judaico-cristã que prega a prática de valores sociais antes da eficiência da aplicação destes valores. Assim como muitos, ele pouco sabia do reflexo dos valores que aplicava. Nem os negativos, nem os positivos e, por tanto, como um cidadão de uma sociedade pseudo-laica, tratava de fazê-los antes de entendê-los.
         Nesta admiração pela existência, uma senhora, com vestimentas mais antiquadas que o comum das senhoras e de rugas expressivas que pareciam contar uma vida em uma linguagem taciturna e contextual com a criatura proprietária, sentou no mesmo banco que o mulato. Tinha em mão um saco de papel marrom e atirava alguns poucos pedaços de pão para as pombas gordas do parque.
         O mulato a parcebeu de sobressalto e ela sorriu como uma avó que pega o neto a fazer traversuras e consente em manter aquelas ações em desconhecimento para os pais da criança. Ele, inconscientemente, sentiu-se confortado e relaxou o corpo como se a combinação entre ele o banco fosse um estado quântico fundamental. E neste mesmo princípio, preferia que ninguém o observasse, que ninguém interferisse, que ninguém cedesse o mínimo de energia que fosse para excitá-lo. Eis que, ao longo de algum tempo, o conjunto senhora - que incluia as rugas, as roupas e uns 70 anos de idade - manifestou-se.
         - Sabes, moço... Hoje faz 5 anos que o meu marido faleceu.
         Ele supôs que a senhora fosse como uma boa velhinha solitária, criadora de inúmeros gatos, que divide os períodos de lazer entre pintar alguns quadros com péssima arte morta, dar pães às pombas do parque e que precisava de alguém de vez em quando para sentir-se viva.
         - Ele sempre me pedia que eu fizesse sexo oral nele. Eu nunca fiz sexo oral na minha vida. Depois que ele morreu, eu comecei a pensar o quão tola eu fui por não ter tentado algo assim. Depois que ele morreu, eu comecei a pensar como seria, sabe? Quero dizer... Como seria fazer sexo oral em alguém... Eu queria lhe pedir...
         O mulato ficou paralisado desde as primeiras palavras da senhora. Não por não saber o que fazer, mas simplesmente pela falta de interesse com tudo até então. O olhar dele repousara sobre uma pedra e ali ficara.
         - Eu poderia fazer sexo oral no senhor?

                                                                                           Cesar Domity
          
        
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