terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Névoa Gelada Lá Fora

Névoa gelada lá fora
Névoa indistinta na distinção das cidades
Aonde o eremita dormia.

Umidade cálida aonde não nascem sonhos com hastes.
Inverno acalentador desta bebida
Que colocaram onde devia estar meu despertador.
Não despertou nada para nada
E o ar continuou pesado
E todas as estradas fechadas.

Bilateralmente, em uma dicotomia hipotética
Percorro a custo a insolação incandescente de duas estradas sem entradas
E fico aqui aonde estou a pensar nisso
Canso as pernas da cabeça de pensar em andar
E depois visto o cansaço como desculpa para não cansar

A conclusão a que chego está fora de questão
E deixou à empregada os jornais de ontem empilhados na minha consciência
Não colocaram ouro de verdade no final de nada
Nem princesas para serem salvas
E se colocarem um dia, vai ser na hipótese
Fujo de qualquer coisa de que eu tenha que pensar em fazer
E penso em como fazer isso
No meio da névoa me procuro, enquanto fujo de mim
E mais uma vez suspensos no tempo
Vários eu's, chegam à conclusão nenhuma
Fazer nada enfim por ter todas as possibilidades de fazer
E continuar a pensar... pensar... pensar.


                                                            Vinícius Faria

Sara


Sara, mais uma noite,
Um copo, depois dorme
E segue

Ruas vazias madrugada
O cansaço de caminhar
O cansaço de ficar

Falar...falar....derramar cascatas de palavras
Para inundar uma rua inteira
Palavras descendo pela sacada como uma cachoeira
Palavras fluindo feito uma hemorragia

Você entende Sara
Entende as minhas palavras
Droga Sara falar...falar...falar e nada
Só mais um copo depois dormi
Você nunca entende nada


                                 Vinícius Faria

Gravidade


Na gravidade do teu sono mudo
Meu movimento solto de um lado a outro
Faz pensar na cama um naufrágio fosforescente
Do teu cabelo morto na fronha
A bordar estampas de sombra
Na meia luz lacônica de uma lua de alumínio na janela
E longe de todas as coisas enreda
O vazio que dança nas calçadas


                                     Vinícius Faria

Foste indigesta ontem


Alma de porcelana quebrada
Luar e suor liso
Ocre de malte e perfume
A roçar vazio entre linho

Do corto, a sensação
De estar do lado errado
Mal ancorado e sem brilho
Cutâneo amargo, e azedo
De tomate e tempero

Cansaço, inércia
E no estomago gelo
No ar cheiro
De água sanitária


                   Vinícius Faria

Canção do exílio

           
Minha terra tem algodoeiros de sorvete
Plantados nas nuvens a passar
E as horas no chão plantadas
São de espinhos ou baobás

Na minha terra cantam poetas sem verso na rua
E os artistas pintam flores tropicais nos vestidos de meninas nuas
Tem os domingos de praia e os domingos de esquina
E mulheres anônimas de cobre

Minha terra tem chão de seca rachado
E fantasmas coloridos na janela
E as tardes que minha terra é mais terra
São sempre as que ainda não há


                                       Vinicius Faria

Substituição Vital


               E naquele ultimo suspiro, eu vivi apenas segundos de cada 13,9 bilhões de anos que se passaram. E tudo que eu vi, morreu comigo. Pois o secreto inacessível pela razão, é a própria morte. Não me adianta saber sobre a vida e do enfadonho nada conhecer. Amortiçar o vago dual. Sou aquilo que não tem principio nem fim, meu corpo só há de dimanar. Brotar, fluir, derivar

                                                       Jéssica Andressa

A Existência Exaurida

Não teremos para nós um amanhã
­Seremos coisa que lembra podridão
Vermes divagantes na frutose da maçã

Algures nos encontraremos em estado de torpor
Olhos semicerrados para a ondulante realidade
Seremos coisa volátil de penetrante odor

Somos desde já a decadência do nosso século
Por isso, estamos em foco para os adormecidos
Por ora, recusamos o dejejum para que o vazio que nos habita
Faça par ao mundano vazio por comida

Meu sorriso é trépido e teu humor é nécio
Logo, o teu sorriso estará por completo desaparecido

Sub-repticiamente nos consumimos
E a sede dos nossos prazeres era tamanha
Que a nossa contínua ebriedade
Não cedia ao adentro do tédio

Teus lábios foram a fonte de minha ruína
E meu corpo, a posteriori, de tua mágoa.
Tuas lábeis palavras conjuraram em mim
O Hades ilusionado em vício.
E minha pele despertou em ti
O imediato desejo pelo precipício.

E este desânimo nos alcança
Furtivamente
Na esquina de todas nossas esperanças.
E a tua covardia
(Mais que a minha)
Veio aqui a se figurar.

Ruboriza-te mais uma vez
Que um amanhã já não no há
Esta tua pequena face
Ser-me-á lembrança
Porém, posso dizer que somente brevemente
Pois tenho fraca minha memória
Ela logo se deteriora
E
Se em meu cérebro tu tens algum lugar
As sinapses da tua região
Logo, logo cessarão
E a tua existência
Finalmente sumirá.

                                 Cesar Domity

O Início

Ela tinha deixado a escova de dentes. Parece um ato pequeno, mas este é o grito do desajuizado aventureiro que desencadeia uma montanha de gelo, que já é por si só um sistema caótico, a desmoronar e ir para um estado de menor energia. 
         O que poder-se-ia fazer? Outra pergunta que parece simplista demais do modo apresentado. Parece como uma placa escrito "coma" que te faz pensar se há algum limite ou instância em que se deveria parar de comer, como que se esta fosse virar-se com um sinal de "stop" a ponto de sentirmo-nos um dextro carro inglês em plena rua às 16:58. Este é o paradoxo pendente. Pela idade da razão, o lógico seria uma atitude de isolamento e desenvolvimento individual. Os próprios neurocientistas afirmam que pelos 20 anos temos atividade cerebral máxima, o auge da formação de nosso cérebro. Após, há uma curva de decaimento pelo resto da vida.  
         E logo neste dia tão abstrato, em meu ápice da razão, ela deixou no banheiro sua escova.

                                                          Cesar Domity

O Terceiro Amigo do Banco

Tinha uns doi metro de altura que só, assim galalau. Chupado, meio pelancudo, parrudo e era desses mureno claro. Não tinha este jeito arretado da gente daqui. Era mai abobaiado, assim meio leso.
Sentô ao lado da gente. Tudo no banco da praça. Tinha birita nas mão e ofereceu quando foi pegá a paia. Nan quisemo. Daí, ele inrolô e fumô pitando.., Sereno. Veio de pescador e resolvêmo prosiá.
         Só que a gente uvia e concordava de vez ou ora. Subemo que tinha cão, tinha gato, tinha inté papagaio. N’um tinha fio nem mulé. Se fô p’ra dizê, no início pensei que era esmolé, má num tinha cara de lambaio também. Parecia mai bom di vida.
Nu início, ficamo os dois disconfiado. O cabra veio meio assim... Má até que inté bebemo um pouco com morenu. Contei sobre a frutêra que a gente tem. E inté perguntei se era da capital. Disse que non era. Murava ali memo. Má qui era nortenho de nascença.
Era meio leso, má n’um era brocoió não. Cabra podia vendê a casa pegando fogo, se carecesse. Contô da família. Na potoca nos fomumas duasora. Nóis tinha que chega cedo p’ra fechá a casa p’rá n’um entra muriçoca daí. Má antes da gente pega o bêco, o mureno jogô o pito no chão e ia segui viage.
         Nego deu três passo, oio p’ra nóis.  Oio di volta p’ra frente. Só n’um ando mais. E nóis que pensava que o ômi ia falá que deu tiro in mulé, matô gente - daí o sinhor vê. Caiu ali memo. Di frente. Curvado qui nem berimbau. N’um saracotiô muito e fico pedrado nu chão. No fim, acho que era um cabra bom. Má nunca vamo sabe, sô.

                                                          Cesar Domity