quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

O Âmago (II)

II

Narrei, de inicio, um constrito dia na cidadezinha, quiçá, por parte do pai ou de toda e população por não se atentarem com aqueles dois e obstruírem este desenlaço, tampouco eu, que deveras poderia, não o fiz; ninguém nada fez durante estes seis anos. A seguir, conto-lhes a noite que antecede este mesmo.
Antes de anoitecer, eu saia de casa para conversar com Bismuta pela falha da madeira no chão do quarto da pequena. Desde cedo da tarde, ela era impedida de sair, pois seu pai, nestas horas, exercia seu encargo, e após , se dirigia para algum boteco.
- Prima!
- Primo Túlio!
- Estava com saudades.
- Também eu. E sabias que esta expressão só existe no português?
- De onde você tira isso?
- Eu li.
- Um dia aprenderei a ler.
Nesta época, deveria eu ter cinco anos, sempre admirei Bismuta e nestes meu quarenta que se passaram, nunca me esqueci daquele sorriso sublime. Aquela pele alva, olhinhos pequenos, iluminados e negros como o de seu pai.
Por algum tempo conversamos; lembro-me dela recitar algumas poesias e falar coisas do tipo “Uma vez, achei uma rosa branca e ela pode proporcionar-me mais felicidade que a humanidade”. Devo admitir ao exímio leitor, que as precisas palavras foram estas, não obstante, uma mera criança não de tudo logra lembrar. Não paremos, porém, por aqui. Conquanto eu não tenha entendido muitas estórias de Bismuta, uma, em especial, chamou-me alguma concentração.
- Sabes quem foi o Buda, primo Túlio?
- Confesso que não.
Até senti-me um leigo do mundo com isto, Sabia bem eu que ela dispunha de muitos livros, porque seu pai, devo confiar ao leitor, sempre foi um letrado. Mamãe dizia que “Aquele que se mostra bom aos outros com inteligência é que é inteligente” e também que “A inteligência usada apenas para si é burrice”. Papai, vezes e outras, argumentava com contras “Se egoísta não és, tu terás nunca o que queres. Por fim altruísmo regozija ao próxima o egoísmo a si. Deixe a filantropia aos padres”
Constantemente, as frases do papai animavam-me, sentia conceber o mundo. Sentia-me orgulhoso de mim. 
- Bom, há muitos anos, ele levou seus discípulos para meditarem abaixo de uma árvore; todos esperavam discursos sobre quem ser ou o que fazer, contudo, tão-somente levantou uma flor e, nesta instância, um deles sorriu. Buda pegou-o pela mão e enuncio aos outros: Este aqui entende; o restante ficará aqui para meditarem e entenderem.
- E o que era para entenderem?
- Ora primo! Queres não que eu mastigue o arroz de sua boca?
Hoje, compreendo o que ela sugeriu, mas naquela época, embruteci-me com Bismuta e eu nem comia arroz naquela hora. Ela encerrava ares tão adultos vez ou vez, que parecia me chamar de tolo com aquele puro sorriso. Dei as costas neste momento e avistei Seu Cândido dançando sem música ao caminhar. Levantei-me e corri para casa, chegando sob os últimos raios de sol. O ocaso que precede aquele dia.
Não conseguia dormir, pois os pica-paus, já à noite, estavam perto da minha janela, no segundo andar da casa. Odiava aqueles animais. A cada poucos instantes um estouro na parede.
Estava friíssimo para sair do gozo do meu leito – francamente era um grabato – e o sono, cada vez mais palpável, pegou-me. Penso ter acordado oito à treze vezes por estes ignóbeis pássaros, e ainda, levantar para gritar e por fim acordar todos? Por obséquio, não eu!

                                               Cesar Domity

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